A Luz no Design Psicoestético: um nutriente essencial

A Luz no Design Psicoestético: um nutriente essencial

Publicado por Rui Rocha on 29th Jul 2025

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Recentemente a ciência tem recuperado a importância da luz natural para a saúde humana. Antes da descoberta dos antibióticos a medicina usava a luz natural como terapia.
Com a idade moderna, fomos tratando a luz artificial de forma descuidada por desconhecimento do impacto da importância da luminosidade e da sua dinâmica na saúde humana.
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Fonte: Prism splitting light into a color spectrum (Imagem representativa). Fonte: Knewz.com (28 de junho de 2025).
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A Luz natural

No início do séc. XX, a helioterapia (tratamento médico com banhos de sol) teve sucesso no combate a doenças difíceis como a tuberculose e até na recuperação de doentes da gripe de 1918. Décadas de pesquisas documentaram que evitar completamente o sol pode ser prejudicial: num estudo de 20 anos na Suécia com 30 mil mulheres, aquelas que evitavam apanhar sol tinham um risco 60% maior de mortalidade comparado com as que mais se expunham (especialmente maior incidência de doenças cardiovasculares). Ou seja, a luz solar adequada não só melhora qualidade de vida, como parece literalmente prolongá-la. Recentemente, o Dr. Huberman, neurocientista da Universidade de Standford recomenda 10 minutos de sol nas primeiras horas após acordar (mesmo em dias nublados) como uma forma simples de melhorar o humor, aumentar a energia e preparar o cérebro e o corpo para um dia produtivo.
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Fonte: Fotografia do Sanatório Marítimo do Norte. Fonte: Restos de Colecção (29 de dezembro de 2011).
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A vida na Terra evoluiu sob um ciclo diário de luz e escuridão. O nosso organismo desenvolveu um ritmo circadiano interno de aproximadamente 24 horas, sincronizado principalmente pela luz solar.
De manhã, a luz natural entra pelos olhos e estimula o núcleo supraquiasmático do cérebro, atuando como o “reset” diário do nosso relógio biológico. Esse sinal luminoso desencadeia uma cascata hormonal: aumenta os níveis de cortisol (dando-nos energia e foco matinal) e inibe a melatonina (a hormona do sono) para nos manter despertos. Este pico matinal de cortisol, estimulado pela luz, não só nos desperta como também reforça o sistema imunitário e o metabolismo na hora certa.
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Fonte: Representação do espectro visível da luz (380–780 nm). Fonte: ERCO – Designing with Light (publicado cerca de 10 meses atrás, 2024‑2025)
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A Luz artificial

Se a luz natural nos nutre, a iluminação artificial moderna pode, paradoxalmente, nos “intoxicar” quando mal utilizada. Desde a invenção da lâmpada elétrica, e especialmente com LEDs e ecrãs eletrónicos por toda parte, estamos expostos a tipos de luz aos quais a biologia humana não se adaptou completamente. Um dos maiores vilões identificados é a luz azul à noite – aquela luminosidade fria de ecrãs, smartphones, TVs ou lâmpadas LED brancas que emitam forte componente azul. À noite, essa luz pode confundir profundamente o nosso relógio biológico. Conforme reportado pela Harvard Medical School, a exposição a luz durante a noite “desregula o relógio circadiano” e suprime a melatonina, prejudicando o sono; evidências ligam a exposição crónica noturna (como em trabalho por turnos) a maior incidência de cancro, diabetes, doenças cardíacas e obesidade.
De todas as cores do espetro, a luz azul é a mais problemática à noite. Durante o dia, a porção azul do espetro (presente no sol) é benéfica: aumenta a atenção, o tempo de reação e o humor. Contudo, depois do pôr do sol, esses comprimentos de onda tornam-se os mais disruptivos para o cérebro. Os especialistas recomendam usar luz vermelha ou laranja fraca à noite (menos energética e menos captada pelo sistema circadiano) – por exemplo, lâmpadas de tom âmbar para iluminação ambiente ou mesmo óculos com lentes cor de laranja para filtrar a azul. O próprio Huberman relata que adotou lâmpadas vermelhas a partir das 21h em casa para minimizar a supressão de melatonina, e que isso melhorou muito o seu sono. Estratégias como Night Shift no telemóvel ou filtros noturnos nos computadores partem do mesmo princípio: reduzir os azuis e intensidades nas horas de deitar.
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A Luz no Design de Interiores

Assim parece-nos evidente que a Luz é um elemento central no Design de Interiores, muitas vezes tratado de forma superficial, tendo em conta apenas valências estéticas. Urge tratar a luz de uma forma psicoestética, ou seja, ter em conta os aspetos psicológicos no projeto de iluminação, onde a luz artificial é escolhida e programada para apoiar os ritmos biológicos e o bem-estar de quem usa o espaço. 
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O que podemos integrar nos projetos de interiores para incluir os aspetos psicoetéticos da luz?

Verificar o Índice de Rendering de Cor (CRI)

Mede o quão bem uma fonte de luz reproduz as cores reais dos objetos, em comparação com a luz natural. Lâmpadas de CRI baixo (p. ex. alguns LEDs baratos ou fluorescentes) fazem tudo parecer deslavado ou com tons distorcidos – o vermelho pode parecer acastanhado, o verde pode perder vivacidade.
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Fonte: Ilustração demonstrando como os LEDs SunLike revelam a cor. Fonte: Ledrise Led Professional (20 de janeiro de 2023)
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Pesquisas indicam que fontes de luz de alto CRI (90+), similares à luz do dia, podem melhorar o desempenho cognitivo, aumentar o bem-estar e até reduzir riscos de depressão e ansiedade nos ocupantes. Por outro lado, exposição prolongada a iluminação de baixo CRI (espetro pobre) tende a desalinhar o nosso relógio interno, potencialmente contribuindo para distúrbios do sono e oscilações de humor.
Há ainda um ganho indireto de se usar luzes de alto CRI e espetro completo: as cores verdadeiras das decorações, paredes e objetos são reveladas.
No gráfico em cima, podemos analisar a diferença dos diversos tipos de luz, onde podemos confirmar que o led normal e a luz flurescente não nos nutrem em todas as cores.
Aqueles que mais se aproximam da luz natural são os led TRI-R, mais difíceis de encontrar no mercado. Paradoxalmente a segunda melhor alternativa são as lampadas incandescentes, na medida que apresentam um espetro desviado para o vermelho, mais confortável e saúdavel no uso mais comum - à noite.
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Escolher a temperatura de cor – medida em Kelvin (K).

No design de iluminação, falamos em luz “quente” versus “fria”: luzes quentes têm tonalidade amarela/alaranjada (baixos Kelvin, ~2700–3000K), enquanto luzes frias são azuladas/brancas (altos Kelvin, ~5000–6500K). Cada uma serve a propósitos diferentes. Em geral, luz quente cria um ambiente de conforto e intimidade, propício ao relaxamento; é o que se usa em salas de estar, quartos e restaurantes, onde queremos um clima tranquilo e acolhedor. Já a luz fria e clara favorece a concentração, o estado de alerta e a energia, sendo adequada para escritórios, cozinhas, salas de aula ou outros espaços de trabalho e manhã.
Estudos mostram que pessoas em ambientes de trabalho com iluminação mais fria e intensa tendem a ficar mais atentas e produtivas, enquanto em ambientes domésticos à noite, tons quentes ajudam o corpo a descomprimir e preparar-se para o sono.
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Fonte: Ilustração sobre critérios para escolher produtos de iluminação LED. Fonte: Advance – Lighting & Electrical Distributors
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Iluminação dinâmica

É hoje possível desenvolver projetos de iluminação dinâmica nos interiores.
Sistemas cuja intensidade e cor da luz variam conforme a hora do dia, imitando o ciclo solar. De manhã, acendem-se luzes mais frias e brilhantes; à tarde, tons neutros; à noite, reduz-se a intensidade e entra o espetro quente avermelhado. Isso já é viável com LED inteligentes e controladores (DMX, DALI, apps etc.).
Exemplos: num escritório, pode-se programar 8h-12h luz branca fria 5000K bem iluminada para estimular a manhã, 12h-14h reduzir um pouco a intensidade para conforto pós-almoço, 15h-18h manter uma luz neutra clara para foco, e a partir de 18h gradualmente mudar para 3000K suave, preparando o pessoal para desligar do trabalho.
Em hotéis ou residências, podemos instalar fitas LED TRI-R com sintonia circadiana, que mudam de cor automaticamente – amanhecer dourado, meio-dia brilhante, crepúsculo alaranjado.
Ambientes internos com iluminação sincronizada ao ritmo circadiano melhoram o sono, o humor e até a produtividade dos utilizadores.
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Posicionamento é quantidade

Naturalmente, um design saudável de iluminação também considera a quantidade e posicionamento das luzes. Luz insuficiente causa cansaço visual e pode deprimir o ânimo, os nossos cérebros associam escuridão prolongada a monotonia e insegurança. Por outro lado, uma sala uniformemente muito iluminada a toda hora pode causar sobreativação e stresse. O equilíbrio é delicado.
Sistemas flexíveis, com dimmers ou múltiplas camadas de luz (ambiental geral, luzes de tarefa, pontos de destaque), permitem ajustar o cenário conforme a necessidade. Por exemplo, ter apenas luz de teto forte não é o ideal; combina-se luz difusa no teto com candeeiros de pé ou de mesa, criando zonas de diferentes níveis de luminosidade – isso torna o espaço visivelmente mais confortável e “humano”.
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Promoção da luz natural

A luz natural dentro dos edifícios é um elemento central do design biofílico, uma abordagem que busca reconectar interiores com a natureza para melhorar o bem-estar. Ambientes com abundante luz do dia e vistas para fora reduzem o stresse, baixam pressão arterial e aumentam satisfação dos utilizadores. Em hospitais, estudos clássicos mostraram que pacientes internados em quartos com vista e luz natural recuperam mais rápido e requerem menos medicação para a dor comparados a pacientes em quartos escuros voltados para paredes. Trazer luz solar difusa por claraboias ou grandes janelas melhora marcadamente o humor de funcionários e reduz a fadiga. Como citado numa publicação da Rockfon sobre design de hospitais, otimizar a luz natural nas instalações diminuiu tempos de internamento e níveis de depressão e fadiga nos pacientes, além de reduzir o burnout da equipa de saúde. A conexão visual com a luz do sol dá-nos um senso de passagem de tempo saudável, alimenta a produção diurna de serotonina (neurotransmissor associado ao bem-estar) e reforça aquele alinhamento circadiano.
Existem empresas de tecnologia e iluminação que desenvolvem e promovem soluções como o LED de espetro solar e modos noturnos. No design, termos como “circadian lighting” e “biophilic design” deixaram de ser tendência de nicho para se tornar boa prática mainstream.
Sugerimos uma visita ao site: https://optimizeyourbiology.com, para explorar as soluções tecnológicas existentes ao nível de produtos biofílicos.
Olhar para a luz como um nutriente é uma perspetiva chave no design que usa o método psicoestético.
No Interior Guider consideramos que um bom projeto de iluminação é um dos exemplos mais claros do impacto na saúde psicológica do design de interiores no bem-estar e desenvolvimento pessoal dos clientes.
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Referências

• Midwestern Doctor – “Natural Light is An Essential Nutrient: The Forgotten Side of Medicine”, artigo que compila pesquisas sobre os benefícios da luz natural e os malefícios da luz artificial.
• Huberman, A. – “Using Light for Health” (Huberman Lab Newsletter, Jan 24, 2023), onde o Dr. Huberman explica como a luz influencia humor, sono, hormonas e oferece dicas como ver luz solar matinal e usar luz vermelha à noite.
• Health Harvard – “Blue light has a dark side” (Harvard Health Letter, Jul 24, 2024), discutindo o impato da luz azul noturna na melatonina, sono e doenças crónicas.
• Hamblin, M. – “Mechanisms and Mitochondrial Redox Signaling in Photobiomodulation” (Photochem Photobiol, 2018) – revisão científica sobre terapia de luz vermelha/infravermelha, mostrando absorção pelas mitocôndrias (citocromo c oxidase) e efeitos anti-inflamatórios e regenerativos.
• Huberman Lab Podcast #68 – “Using Light (Sunlight, Blue Light & Red Light) to Optimize Health”, comentários sobre terapia de luz vermelha melhorar visão, pele e sono.
• Seoul Semiconductor – Estudos sobre LED SunLike de espectro solar, incluindo pesquisa do Brigham & Women’s Hospital/Harvard mostrando melhorias cognitivas e circadianas com luz de espectro diurno vs LED convencional , e estudo da Univ. Basel sobre sono . Press release “If You Want Better Sleep, You Need Better Light” (2025) explicando como espectro natural do SunLike suporta ritmos biológicos.
• Unibox Lighting – “The psychological effects of lighting: how light affects mood and well-being”, guia para designers detalhando influência da iluminação na perceção, humor e ciclo circadiano.
• Coohom – “Impact of CRI on Rhythm and Mood”, artigo explicando que luzes de alto CRI (semelhantes à luz natural) melhoram bem-estar, desempenho cognitivo e humor, enquanto luz de baixo CRI pode prejudicar o ritmo circadiano.
• Border States – “Lighting Psychology 101: How Lighting Affects Mood and Perception”, explora como posicionamento, brilho e cor da luz moldam a atmosfera percebida, citando efeitos como luz brilhante aumentar alerta e luz quente promover relaxamento.
• Rockfon (2022) – “Impact of Natural Light on Outcomes in Healthcare Settings”, artigo sobre design biofílico em hospitais, cita redução de depressão, dor e estadia hospitalar com mais luz natural e vista para exteriores.
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Imagens
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• Knewz.com. (2025, 28 de junho). Scientific Experiment Produces Pulse of Light That Can Coexist in 37 Dimensions at the Same Time [Imagem]. Recuperado em 30/07/2025, de https://knewz.com/world/scientific-experiment-produces-pulse-of-light-that-can-coexist-in-37-dimensions-at-the-same-time/

• Restos de Colecção. (2011, 29 de dezembro). Sanatório Marítimo do Norte [Imagem]. Recuperado em 30/07/2025, de https://restosdecoleccao.blogspot.com/2011/12/sanatorio-maritimo-do-norte.html

• ERCO. (2024/2025). Light spectrum: definition and explanation [Imagem]. Recuperado em 30/07/2025, de https://www.erco.com/en_us/designing-with-light/lighting-knowledge/photometry/light-spectrum-7528/

• Ledrise Led Professional. (2023, 20 de janeiro). SunLike Natural Spectrum LEDs reveal the true color and depth of artistic works [Imagem]. Recuperado em 30/07/2025, de https://www.ledrise.eu/blog/sunlike-leds-reveal-color-and-depth-of-art/

• Advance – Lighting & Electrical Distributors. (s.d.). Como Escolher Produtos de Iluminação LED [Imagem]. Recuperado em 30/07/2025, de https://advance-rr.com/noticia/3